Limites nos pedidos de restituição/compensação de IRPJ e CSLL pela Receita
Decisão da 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais do Carf é importante precedente para os contribuintes
Em julgamento realizado em dezembro de 2021, a 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais do Carf proferiu importante decisão, reconhecendo a existência de limites na análise de pedidos de restituição e compensação de saldos negativos de IRPJ e de CSLL pela Receita Federal.
Os contribuintes sujeitos à tributação com base no Lucro Real (anual ou trimestral) devem apurar, no encerramento do respectivo período, as bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, bem como os tributos devidos. Na mesma oportunidade, também deverão deduzir, dos tributos devidos, as antecipações realizadas durante o exercício (pagamento de estimativas de IRPJ e de CSLL, e retenções sofridas na fonte) e eventuais incentivos fiscais a que têm direito.
Nos termos do inciso II do §1º do artigo 6º da Lei 9.430/96, se os valores das antecipações realizadas durante o período de apuração superarem os montantes devidos a título de IRPJ e de CSLL, serão apurados os denominados “saldos negativos de IRPJ e de CSLL”, que constituem créditos passíveis de restituição e de compensação pelos contribuintes, nos termos do artigo 74 da Lei 9.430/96.
Os contribuintes possuem o prazo de cinco anos para pleitear, administrativamente, a restituição e/ou compensação dos saldos negativos de IRPJ e de CSLL, nos termos do artigo 168 do Código Tributário Nacional (CTN), mediante a transmissão eletrônica do PER/DCOMP, cujo procedimento é atualmente disciplinado pela Instrução Normativa RFB nº 2.055/2021.
É comum em processos administrativos de restituição e/ou compensação que, a pretexto de analisar a liquidez e certeza dos créditos decorrentes dos saldos negativos de IRPJ e de CSLL, a Receita Federal promova verdadeira revisão das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL apuradas pelos contribuintes, mediante verificação de eventuais “omissões” ou “inexatidões” na Escrituração Contábil Fiscal (ECF).
De fato, e a partir de alegações envolvendo, por exemplo, a não tributação de receita e a indedubitilidade de despesas, a Receita acaba por promover ajustes nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL declaradas na ECF, refletindo no cálculo dos valores dos tributos devidos no respectivo período de apuração, cujo resultado, invariavelmente, é o não reconhecimento (ou reconhecimento em menor extensão) dos créditos dos saldos negativos.
Contudo, nos parece que, no bojo de processos administrativos de restituição e/ou compensação de saldos negativos de IRPJ e de CSLL, não há espaço para a Receita Federal promover a revisão das bases de cálculo dos tributos e muito menos ajustá-las mediante adições ao Lucro Líquido e glosas de despesas, ainda mais quando superado o prazo decadencial de cinco anos.
Com efeito, a apuração do IRPJ e da CSLL é realizada no âmbito do denominado “lançamento por homologação”, nos termos do caput do artigo 150 do CTN, pelo qual o contribuinte, unilateralmente, apura o tributo, promove o seu pagamento e apresenta as declarações pertinentes para o fisco, ficando o seu procedimento sujeito à revisão e homologação pela autoridade administrativa competente.
Sendo assim, e havendo “omissões” ou “inexatidões” nas declarações apresentadas, a apuração realizada pelos contribuintes somente pode ser alterada pela Receita Federal mediante lavratura de auto de infração, conforme o disposto nos artigos 142 e 149, inciso V, todos do CTN, que é o procedimento previsto na legislação para a revisão de ofício.
O §4º do artigo 9º do Decreto nº 70.235/72 é categórico ao determinar a lavratura de auto de infração “também nas hipóteses em que, constatada infração à legislação tributária, dela não resulta exigência de crédito tributário”, o que ocorre justamente nos casos de “omissões” ou “inexatidões” na apuração dos contribuintes e cujo ajuste conduz à redução ou extinção dos saldos negativos de IRPJ e de CSLL.
Além disso, o parágrafo único do artigo 149 do Código Tributário Nacional estabelece que “A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública”, reportando ao prazo decadencial de cinco anos, previsto nos artigos 150 e 173, inciso I, do CTN.
O prazo decadencial de cinco anos, previsto nos artigos 150 e 173, inciso I, do CTN, a rigor, não se aplica, apenas e tão somente, à lavratura de auto de infração para exigência de tributos, mas também à revisão da apuração dos contribuintes realizada no âmbito do “lançamento por homologação”, inclusive à luz do §4º do artigo 9º do Decreto nº 70.235/72.
Assim, não deve ser admitida a revisão das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL em processos administrativos de restituição/compensação. A revisão das bases de cálculo dos referidos tributos exige a lavratura de auto de infração e a observância do prazo decadencial de cinco anos.
E, não havendo prévia lavratura de auto de infração e observância do prazo decadencial de cinco anos, a análise da Receita Federal deve ser limitada à confirmação das parcelas computadas na liquidação do IRPJ e da CSLL devidos (por exemplo, pagamento de “estimativas” e IRRF) e que formaram os saldos negativos pleiteados.
A discussão jurídica em referência não é nova no âmbito do Carf, revelando-se bastante controvertida. Em julgamento realizado em dezembro de 2021, a 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais do órgão voltou a rediscutir a matéria, decidindo, por maioria de votos, favoravelmente aos contribuintes.
No Acórdão nº 9101-005.937, proferido nos autos do Processo Administrativo nº 15578.000723/2009-98, prevaleceu o entendimento no sentido de que “o indeferimento de pedido de restituição/compensação de créditos apurados pelo contribuinte, quando ocorre a revisão da apuração regularmente escriturada e declarada ao Fisco, não prescinde da realização do lançamento por meio do competente auto de infração ou de notificação fiscal e que, uma vez transcorridos os prazos previstos nos artigos 150, §4º e/ou 173, inc. I do CTN, tal atividade resta obstaculizada pela ocorrência do instituto da decadência que, uma vez configurado, fulmina qualquer pretensão do Fisco no sentido de reexaminar a base de cálculo apurada”.
No referido processo, o contribuinte apurou prejuízo fiscal e o saldo negativo de IRPJ foi formado pelo IRRF. Por sua vez, no processo administrativo de restituição/compensação, a Receita Federal glosou o prejuízo fiscal, recalculando a base de cálculo do IRPJ e o imposto devido, cujo resultado foi o indeferimento do crédito pleiteado.
E, ao final da discussão administrativa, prevaleceu na 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais do Carf o entendimento no sentido de ser improcedente a pretensão da Receita Federal de revisar a base de cálculo apurada pelo contribuinte sem prévia lavratura de auto de infração e também após o decurso do prazo decadencial de cinco anos.
Esta decisão proferida pela 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais do Carf constitui importante precedente sobre a matéria para os contribuintes, na medida em que impõe limites na análise de pedidos de restituição e de compensação de saldos negativos de IRPJ e de CSLL pela Receita Federal do Brasil, e não admite a revisão das bases de cálculo dos referidos tributos sem prévia lavratura de auto de infração e também após o decurso do prazo decadencial de cinco anos.